Vai uma cerveja?

Foto de Anjinhainlove

Era Sábado à noite. Tínhamos passado a noite num espectáculo de um cantor famoso e, como já era ritual, os homens tinham estado na barraca a beber cerveja.
Quando chegou a hora de partir para casa chegaram os homens ao pé de nós, o meu pai e o meu tio, quando a minha mãe solta as palavras malditas: “Estás bêbado!”.
Os risos tornaram-se gritos e o som das vozes elevou-se. Entrámos no carro como o coração aos pulos, a pele suada e as mãos a tremer. O que a bebida faz à cabeça de uma pessoa…
Quando chegámos a casa, todos sabíamos o que fazer. Saímos do carro, enquanto que o meu pai voltou a sair. Eu e a minha irmã fomos para as nossas camas, tal como a minha mãe e a minha tia.
A casa estava serena, até que ouvimos aquele barulho que nos cortava a respiração. O carro a aproximar-se de casa, ele a chegar! O meu coração batia mais rápido e os meus olhos estavam fechados com toda a força que conseguia.
A porta abriu-se e ele entrou, sem barulho. Parou durante uns minutos. “Brum!”, “Plim!”, “Tshh!”!
Sentei-me na cama, encolhi as pernas e envolvi-me com os lençóis, como se me estivesse a proteger do que se estava a passar. O barulho continuou por breves segundos até que ouço passos apressados a correr pelo corredor e ouço a voz da minha mãe: “O que estás a fazer?” e ouço os seus passos a descer as escadas apressadamente. A minha reacção foi correr, abrir a porta e ver o que se passava, mas antes disso já ouvi pancadas fortes, gritos, choro, lágrimas e a voz da minha tia “Pára! Vais matá-la!”. Abri a porta e vi a imagem mais triste da minha vida: a minha irmã, com 8 anos parada, com as lágrimas nos olhos, a gritar “Pára papá, para!”. Virei o meu olhar na direcção do olhar dela e vi o que tanto a assustava. A minha mãe deitada no chão, com o corpo enrolado, ensanguentada, com as mãos na cabeça e o meu pai na sua pose forte, com a cara a emanar cólera e uma cadeira nas mãos pronta a ser partida no corpo fraco da minha mãe.
Gritei, chorei, senti a minha alma a sair do meu corpo. Olhei para a minha irmã, corri para ela, tapei os seus olhos e fugi com ela para o meu quarto.
As nossas mãos tremiam tanto que me sentia cansada, os nossos prantos eram como facadas, temia pela vida da minha mãe, temia pelo meu pai, temia pelo coração da minha irmã., as nossas lágrimas caiam, uma após outra, cada vez com mais força.
Abracei-a com força. Ouvíamos as pancadas, os gritos e as lágrimas. A minha tia tinha impedido o meu pai de atirar a cadeira. Levou-o para o quarto, sentou-o e ordenou à minha mãe que fosse para o seu quarto.
Ouvimos a conversa, da qual me recordo vagamente, continuava a abraçar a minha irmã e a tentar fazer por ela o que nem por mim conseguia fazer. A calma era impossível. Mais do que por mim, temia que a minha irmã se tornasse uma criança traumatizada, revoltada pelo que viu.
Tudo acalmou, já não ouvia ninguém falar, a minha mãe estava no seu quarto, a minha irmã já se acalmava e eu também, quando ouço novamente passos a descer as escadas. Era a minha mãe! Corri a abrir a porta e já só vi o meu pai a apertar o pescoço da minha mãe com tanta força que ela já nem conseguia resistir, até a minha tia intervir.
Lembro-me de parar a meio das escadas e gritar a plenos pulmões “Para pai, para!”, mandei a minha irmã para o quarto e ouvi as palavras “Chama a polícia.”. Sabia que se não o fizesse podia perder a minha mãe.
Corri para o quarto, ainda ouvia a minha mãe a gritar, e o meu pai a bater-lhe. Ainda ouvia as tentativas desesperadas da minha tia acalmar.
Liguei para a polícia, tremia tanto que mal conseguia marcar os simples três números no telemóvel. Atenderam. Chorava tanto que era difícil falar e disse:
-Preciso de ajuda. O meu pai bebeu e está a bater na minha mãe e a partir tudo. – E as lágrimas interromperam-me.
-Qual é a sua morada? – Perguntaram do outro lado da linha.
No entanto, não conseguia falar. Chorava tanto que as palavras não saíam. Ouvi a pergunta repetir-se mais umas vezes até que desligaram.
Senti-me tão revoltada por ser abandonada por quem devia cumprir o seu dever que me apeteceu partir o telemóvel, mas voltei a ligar.
Desta vez aconteceu o mesmo, mas consegui dizer a morada. Aproximei-me da minha irmã e disse “A polícia vem aí. Vai correr tudo bem.”.
As coisas acalmaram-se. A minha mãe correu para o quarto, o meu pai preparava-se para sair e passar a noite fora. Eu desci as escadas e olhei em meu redor: a mesa e as cadeiras da cozinha estavam desfeitas. As estantes estavam no chão e tudo o que lá estava também. O candeeiro da sala estava partido, tal como a mesa de chá, que estava com um dos pés partidos. Havia rastos de sangue no chão. Ouvi o meu pai aproximar-se e corri para o quarto. Saiu, fechou a porta, entrou no carro e partiu. A minha mãe desceu as escadas, tal como todas nós que nos juntamos na cozinha. Ela tinha sangue na mão e manchas negras e vermelhas no corpo todo.
Ouvimos o carro da polícia chegar e já estávamos prontos para o mandar embora, mas junto com o carro da polícia vinha o meu pai. Vinha com uma expressão serena, como se nada se tivesse passado, mas a minha mãe insistiu em apresentar queixa.
Perguntaram quem ligou para a polícia. Apontaram para mim. Olhei nos olhos do meu pai. Mostravam uma pessoa que se sentia traída, desiludida, enraivecida. Fiquei com medo.
Interrogaram todas as pessoas que estavam na casa, mandaram o meu pai embora e nós fomos para a casa da minha tia, no carro da polícia.
Foi uma noite trágica, mas a parte que mais me tocou foi depois.
A minha mãe e a minha tia estavam no hospital, nessa mesma noite. Eu estava em casa da minha tia com a minha irmã. Estávamos estafadas, deitadas na cama. Ela já dormia, eu não conseguia. Ouço o meu telemóvel tocar. Era ele, o meu pai. Pouco me lembro da conversa, mas uma frase nunca esquecerei, ficará comigo para sempre: “Tu não és minha filha, as filhas não fazem isso aos pais. Nunca mais me chames de pai.”. A sua voz estava terrificamente alta, quase conseguia ver a sua cara. Chorei. Chorei até não poder mais, por ter ouvido palavras tão marcantes, e adormeci.
Dias depois, estava a minha irmã a ver um anúncio em que apareciam varias imagens de animais bebés com seus pais, e no fim aparecia uma criança humana sem pais e chocou-me quando ela disse “Eu queria que o papá fosse um ratinho para poder esmagá-lo e ele ver como magoou a mamã.”…
Agora, três meses depois, os meus pais continuam separados. A minha irmã sai todos os fins-de-semana com ele. Quanto a mim, falei com ele pela primeira vez há cinco dias atrás.
Magoa-me não ter pai. Magoa-me mais ainda saber que tudo isto aconteceu devido ao álcool.

Quando pensarem que uma cervejinha não faz mal nenhum, pensem que há pessoas que davam tudo para não a ter bebido.
Gostava também de salientar a competência da polícia portuguesa ao desligar o telefone de uma pessoa em emergência e ao demorar mais de quinze minutos a atender um pedido urgente.

Foto de Mitchell Pinheiro

Que coisa trista minha amiga! me comovi bastante com sua história, principalmente porque já tive muitos problemas em minha família por causa de bebida e, em virtude disso, até hoje nunca coloquei sequer uma goata de alcóol em minha boca. Obrigado por compartilhar-nos sua forte história. um grande abraço!

Tudo que é humanamente possível eu posso conseguir!

Tudo que é humanamente possível eu posso conseguir!

Foto de pstella

Muito triste este seu conto. Porém Completamente real.

Paloma Stella

anadolu yakası escort

bursa escort görükle escort bayan

bursa escort görükle escort

güvenilir bahis siteleri canlı bahis siteleri kaçak iddaa siteleri kaçak iddaa kaçak bahis siteleri perabet

görükle escort bursa eskort bayanlar bursa eskort bursa vip escort bursa elit escort escort vip escort alanya escort bayan antalya escort bayan bodrum escort

alanya transfer
alanya transfer
bursa kanalizasyon açma