esperança

Foto de João Victor Tavares Sampaio

O Crítico, o Cínico, e o Cristão

Três sinos badalam a meia-noite.

Cantam três galos.

O primeiro é o crítico.

O crítico se posta ereto ao pé da serra, pois acha melhor observar a paisagem de cima. Ele cisca para sair toda a areia dos seus pés, sem perceber que levanta o pó na altura do pescoço quando bate suas pequenas patas. O crítico vê as coisas de fora, nunca se envolve com a situação, deixando as raposas roubarem os ovos enquanto suas fêmeas lutam desesperadas. O crítico, apesar de rude, se finge de manso.

O segundo é o cínico.

O cínico entrega seus colegas por trinta moedas de milho. O cínico é o que canta mais alto, pois é o que mais tenta esconder que é brigador, ao invés do frango que oculta debaixo de suas penas. O cínico sequer reconhece quem é, demonstrando felicidade no lugar de tristeza, certeza no lugar de dúvida, consternação no lugar de indignação. O cínico, por sua natureza, mente naquilo que bem acredita.

O terceiro é o cristão.

O cristão canta com amor, pois sabe que pode morrer no final do dia. O cristão carrega a responsabilidade de manter seus filhotes protegidos, seu ninho organizado, sua paz equilibrada. O cristão sabe que não pode expor à si e a sua prole ao desígnios da sorte. Sabe que deve construir uma união entre seus pares para aumentar suas chances de sobrevivência. O cristão, como galo ou como homem, deve zelar pela vida que tem.

Por mais que as parábolas mostrem o caminho que temos a seguir, precisamos ter inteligência suficiente para diferenciar o que é essencial do que é superficial. Por isso, devemos amar uns aos outros. Só dessa forma há a possibilidade do mundo permanecer vivo, apenas mantendo a porta aberta, apenas criando ao invés de matar. Assim se mantém a fé além da existência de um Deus normativo.

Foto de Marilene Anacleto

Tronco Hospedeiro

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Preso às raízes da vida,
Até que caiu no mar
Entre pedras, ondas fortes,
Não sabia onde ia parar.

Grande tempo preso em pedras,
Pensou que ia definhar.
Surgiram criaturinhas,
Abrigo em seu corpo buscar.

Cresceram ali mariscos
E moluscos de toda sorte
Nova vida, novo ânimo,
Para quem esperava a morte.

De novo a voar pelos mares
Em ondas de tempestades
Ora o fundo, ora o céu,
Mais uma longa viagem.

Agora preso na areia
Fina da beira do mar,
Moluscos ainda crescem
Quando a onda os vem beijar.

Transformam-se as feições,
Em figuras diferentes.
Há troncos com cara de bicho,
E outros com cara de gente.

Feito nós, em algumas horas
De humores tão diferentes,
Às vezes, só um tronco seco,
Em outras, incandescente.

Marilene Anacleto

Foto de Cesar Jardim

Identidade

Ainda quero ser igual,
ao que eu era no começo.
Queria ser igual aos outros,
e não pude ser eu mesmo.

Não tenho pressa de encontrar,
o meu caminho mais seguro.
Eu tenho medo de perder,
o que eu perdi à um segundo.

Não tenho pena de mim mesmo,
eu tenho apenas um destino.
Eu perco tudo ao mesmo tempo,
e ainda assim não estou sozinho.

A minha vida vale mais,
do que vale a eternidade.
Não quero mais viver,
nesta prisão sem grades.

Estou livre e tenho asas,
pra voar a qualquer hora.
Mas tenho medo de cair,
e do que vou achar la fora.

Eu sou apenas eu,
e ninguém mais vai ser.
E ninguém vai me separar,
do que não posso ter.

Não sei onde estou,
e por isso estou aqui.
Eu não posso mais voltar,
e não penso em desistir.

Esperei o tempo me levar,
onde eu pudesse me encontrar.
Tentei chegar a algum lugar,
e me perdi ainda mais.

Foto de Marilene Anacleto

Recado

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Crês que não mais te gosto
Vives em isolamento
Entretanto, minha alma se corta
Porque te vejo por dentro.

Confidências que trocamos
Com emoção e calor
Problemas que partilhamos
Soluções com razão e amor.

Nada se foi com o tempo
Nada disso se perdeu
Está tudo entre mim e ti
Nossa vida enriqueceu.

É certo, sofro à distância
Uma oportunidade espero,
Reconheças, na lembrança,
O quanto importante és.

Amigos irás reencontrar
Todos te querem bem
Minha alma se restaurará
Ao sentir tua paz também.

Marilene Anacleto

Foto de betimartins

Amigo confidente

Entreguei uma a uma as dores
Que trazia no meu pobre coração
Era uma lista e tanto, que preenchida
Onde apenas sabia reconhecer as dores...

Falei tanto que não consegui escutar
A suave voz do meu amigo confidente
Ele sorria, divertido, parecia tão paciente
Apenas fez um gesto suave para me calar...

Deu-me suas mãos e convidou-me a voar
Por lugares onde eu nunca tinha estado
Lá de cima poderia ver coisas que jamais
Em minha existência poderei descrever...

Ele me levou a um lugar destruído, terrível
Seu cheiro era nauseabundo, cheiro a morte
Vi um cadáver atrás de outro, crianças, velhos
Não existia salvação, era tudo destruição, apenas...

Mostraram-me minha vida, momentos dela
Como se de um filme tratasse, ferozmente
Logo me leva de novo a terra, mostrando
Como era a fome, o ódio, a ganância e poder...

Voltando a mostrar de novo a minha vida
Apenas sorrindo, calmo e com justiça
Dizendo que nunca estive sozinha aqui
Que Deus habitava no meu coração sempre...

Porque não confiar? Porque sempre lamentar
Apenas meus irmãos não tinham Deus em si
Fazendo as dores do mundo, reinando ali
Nas suas vitimas cegas, altruístas e materialistas...

Eu não sou vitima da dor, mas sim a dor
É minha maior vitima, das atitudes erradas
Dos meus lamentos, de nunca escutar a minha voz
A voz, a tão famosa voz, a voz do meu coração...

Este meu fiel amigo confidente, Jesus meu irmão
Mostrou-me que precisava voltar a renascer de novo
Curar as minhas dores que nada são ao lado de outras
Trajar novas vestes, novo corpo, nova vida, amor...

Feliz eu, coloquei os seus ensinamentos, um a um
Vestindo a humildade, perseverança e a caridade
Revestia minha alma em amor, refletindo a luz
A bela luz do amor, da amizade incondicional...

Foto de KAUE DUARTE

Quando a alma se divide

Foi como as nuvens
Que se juntam para fazer chover
Regar a terra
Criar raizes
Ser apoio ao arco-íres
E depois se separar
O bom motivo é quando as nuvens se disperçam
Raia o sol quando é dia
E aparecem as estrelas quando é noite
Somos como as nuvens
Ora negras
Outrora de algodão
pois nasceram para serem levadas
pelo vento chamado DEUS
Uma lágrima não pode
Mudar ou inverter um quadro crítco
Nem retroceder um placar desanimado
Mais ensina que a derrota
É um segundo lugar num jogo à dois
A unica derrota é nunca ter amado
É nunca ter tentado amar
Mais nisso não erramos
Nos amamos
Só foi no tempo errado
Nas expectativas de novidades
Procurando amor e felicidade
Nos destroços de uma devastação
Encontrei a semente da alma
Que fez nascer em mim
Vida...

Foto de Cesar Jardim

Dália

Não posso mais mover montanhas,
Sou dono da verdade mas não da certeza,
Aquilo que era impuro me torna mais suave,
A primeira impressão, nem sempre é a que fica.

O que deixamos pr'a outra hora,
sempre há tempo pra fazer,
O que me difere em meu mundo,
é ter por quem lutar.

Aquele que fere por ferir,
as vezes se arrepende,
O tolo que acredita em sí mesmo,
fere sua própria consciência.

Vou mudar de opinião,
penso em ter mais liberdade,
Vou procurar respostas,
que não tem explicação a não ser sinceridade,
E depois, tudo tem um fim;

Vou perdoar meus inimigos,
pois eles não creem no amor,
Faço tudo ao meu favor,
mas o vento sopra em outra direção.

A minha ira é apenas compreensão,
Entender qualquer palavra,
é difícil pra quem sente
E o que digo são palavras sem medida,
verdade inconsequente...

Foto de João Victor Tavares Sampaio

O Supremo Sacrifício

Há pessoas que acreditam em um Deus bom, misericordioso, que completa o sentido de todas as coisas. Essas pessoas, de índole limpa, carregam o centro da humanidade até o meio para a sobrevivência. Essas pessoas subvertem a ordem de comando violento, levando ao mundo paz e fazendo com que impérios inteiros se convertam à sombra do desejo máximo de felicidade. Essas pessoas, cristãs ou não, trazem consigo quase sempre a mácula do sofrimento. Essas pessoas sentem medo, mas não se acovardam. São os verdadeiros heróis dessa vida.

Mas o mundo nunca pára no seu girar inconseqüente! Guerras devastam as plantações, os estupros consentidos geram povos estéreis, e todas as velhas cartas de conciliação são queimadas por abandonos de aldeias em labaredas! O amor falha, sim, para dar lugar aos sentimentos menos nobres. O egoísmo sussurra até aos ouvidos mais precavidos. O sopro da morte venta próximo dos templos mais santos das artes barrocas.

O amor é injusto. Fraqueja diante do menor dos golpes. Esconde-se, na grama com os pequenos mamíferos. Perde-se, como um cego recém-baleado. Ainda assim, é a única chance, a única gota d'água que tem como transbordar um oceano de lamúrias, o único caminho para a vereda da verdade, um Sol tranqüilo, de calma e resignação.

O amor é lindo! É belo, e nos faz respirar! Mas não se engane; o amor tem um custo, tão grande quanto seu tamanho. Amar é cair e se ferir! Amar é se desfigurar, diante do ácido da realidade crua. Amar não está totalmente descrito, seja na Bíblia ou nas marcas olímpicas. Amar é cair em desgraça, é lutar, por uma causa perdida. Amar é transpirar, e permanecer vivo apesar de todas as suas conseqüências.

Amor é como um vulcão:
De longe parece dormindo
Um sono em silêncio infindo

Parece, diminuindo
Um âmago refletindo
A Terra perto de uma explosão

Amor, que se ressentindo
Se engrandece evoluindo
Se espalha em progressão

Amor é quebrar a cara!
É morrer em imperfeição;
É na escuridão ter clara
Certeza da imprecisão

Foto de Zoom onyx sthakklowsky kachelovsky kacetovisk

Alvorecer.

Acordei com o canto de um bem-te-vi, que mais parecia gritar meu nome. Sono tempestuoso, conturbado feito concerto dos Sex Pistols. Mas ao despertar, percebi que havia sido apenas mais uma noite mal dormida, assim como tantas outras.
Diante dessa certeza, verdes montanhas emergiram do Céu ao meu redor. Me apressei a encher minha atmosfera com paisagens distantes que ainda não contemplei. Visualizei um lago sereno e sete verões, toquei a terra e me senti um grão daqueles grãos em minha mão.
"Colei" todo o gabarito com as respostas das questões que ainda não foram proferidas ao coração. Na sala escura da Lua, revelei um alvorecer em preto e branco, enquanto o tempo rodopiava sem controle.,

Foto de Marilene Anacleto

Moço Solitário

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*
*
Moço solitário
No barco pensativo
O que será que faz
Deste modo inativo?

Será fome de comida
Ou de mostrar valentia?
Será fome de solidão
Para pensar no dia-a-dia?

Será que procura repouso
No estranho balanço das ondas?
Ou prefere viver com peixes
Em vez de viver com homens?

Ninguém é capaz de saber
Por certo os motivos seus
Quiçá afastou-se do povo
Para encontrar o seu Deus,
Que acredita, encontrará
Na mulher dos sonhos seus.

Marilene Anacleto
05/01/2000

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