Um dia de cão na vida de uma professora

Foto de Carmen Lúcia

Soa o alarme do despertador.Parecia que havia adormecido naquele instante,pois passara a noite a corrigir provas,com todo o cuidado para não cometer nenhum engano,que diminuísse a nota de algum aluno.Caso o erro fosse para “mais”certamente ninguém reclamaria,a não ser aquele coleguinha que havia colado e se sentisse traído,passado para trás,porque o outro conseguira uma nota melhor e as provas eram iguais.
Achou que ainda daria tempo para dormir mais cinco minutinhos...e pegou no sono.Acordou com o sol batendo em seu rosto e o coração aos pulos.Sempre se levantava antes do sol nascer,mas naquele dia foi vencida pelo cansaço.
Levantou-se às pressas,mal lavou o rosto e escovou os dentes,engoliu um copo de leite e saiu correndo até o ponto do ônibus.Era a segunda vez nessa semana que perdia a hora e a diretora da escola não devia estar com “cara muito amigável".
O ônibus não chegava nunca e ela arriscou por várias vezes ir a pé mesmo,pois nesse horário seria impossível arrumar alguma carona.
Mas desistiu logo da idéia, porque a bolsa com todo seu material escolar,mais as provas e cadernos de alunos que levara para correção,pesavam muito.
Finalmente chegou o ônibus e ela sorriu aliviada.Mas logo depois sentiu vontade de chorar,porque o mesmo estava superlotado.Não havia um único lugar para se sentar,nem um vão para entrar nele.Não teve tempo para pensar muito e se agarrou nas duas maçanetas da porta,pés na escadinha,sob o olhar carrancudo do motorista...que deu partida e foi seguindo assim mesmo,com a professora feito pingente.
Ao chegar na primeira esquina,o motorista freou para um senhor de terno que lhe dava sinal,mesmo com a superlotação do veículo.Talvez por sacanagem,para zoar com a professora que estava pendurada e que somente por obra do Divino Espírito Santo não caía.
Bem,o senhor se encaixou por detrás dela,segurando-se também nas maçanetas.E o ônibus seguiu seu percurso.
Ela ficou roxa de vergonha, pois o homem,talvez por medo de se espatifar ao chão,ficou bem coladinho na parte de trás dela.Quem os visse,pensaria em sexo anal,via transporte coletivo...e se fosse um jornalista,então,colocaria essa matéria em sua coluna de jornal:
-Professora transa em ônibus em movimento,pelo lado de fora!!!E lá viriam um processo administrativo e todos os pais de alunos em cima dela...Vixe!-Tomara que chegue logo!-
pensou ela.Mas,à medida que iam descendo os passageiros,ela ia entrando e quando já estava próximo à escola,ela desceu.O senhor,muito distinto,pedira-lhe desculpa e ela lhe sorriu,compreensiva.
De novo correu,pois sua escola ficava distante dali uns 300 m.Foi derrubando material pelo caminho e a todo momento,abaixava-se para apanhá-los...e tremia...tremia muito,temendo a repreensão da diretora pelo seu atraso,mais uma vez.
Apertou a campainha e uma inspetora de alunos,com uma cara mais feia do que era na realidade, veio abrir o portão,parecendo ser a dona da escola...ou querendo imitar a diretora,que ao notar o atraso da professora,olhou para seu relógio de pulso e falou:
-Esses minutos de atraso serão descontados em seu salário!!!
-Descontados em meu salário?Que salário?Creio que nem notarei o desconto...Enfim,era a profissão que havia escolhido e não a que lhe restara...e ela amava o que fazia.Se pensasse em ficar rica,teria optado por outra...Política,talvez...
Ao entrar em sua sala de aula,recebeu alguns beijinhos dos alunos e aquele ar de reprovação de alguns pais,agarrados às mãozinhas de seus filhotes,como se quisessem protegê-los de algum perigo(da professora assassina,quem sabe...),agindo como se professor fosse inimigo número um de seus filhos...o que é bem o contrário.Mas,são ossos do ofício.Precisa-se primeiramente educar os pais(lembrando que toda regra tem exceção),para depois os filhos...Essa é outra grande batalha do professor,mas deixemos para lá.
Pediu às crianças que fizessem a oração de agradecimento,que se sentassem e ouvissem sua explicação.Tentou usar a lousa,mas viu que não havia giz...muito menos apagador.Ela sempre os trazia de casa,mas com a pressa,se esquecera.Não podia deixar os alunos a sós para ir pedir emprestado a algum colega e resolveu mudar o planejamento do dia.
Foi até a quadra ensaiar uma coreografia com os alunos.Logo começariam as festas juninas.Foi procurar o aparelho de som,mas ele já estava sendo usado e havia só um na escola.Ensaiou uma dancinha assim mesmo...sem música.Cantou,dançou,gritou,esgoelou para que a ouvissem, até perder a voz.Sentia o corpo esquartejado.
Seu estômago roncava de fome...Não havia comido nada...bebera apenas um copo de leite.
Soou o sinal do recreio e ela levou seus aluninhos até a sala de aula,para pegarem seus lanches e depois retornara com eles ao pátio,lugar onde costumavam lanchar.
Foi à sala dos professores tomar apenas um cafezinho,pois não levara nada para comer...
De repente,começou a espirrar...Toda a atribulação daquele dia havia mexido literalmente com seu emocional...transformando-se numa terrível rinite.
Agora,além de ter perdido a voz durante os ensaios,começara a espirrar incessantemente...E não conseguia mais manter a disciplina dos alunos,que brincavam na sala de pega-pega,pula-pula,pique-esconde...e de jogar aviõezinhos uns nos outros.
Rezou para que terminasse a aula...que desse o sinal de saída urgentemente.Minutos intermináveis!Nunca uma aula fora tão longa.Depois de uma eternidade,chegara o momento de ir para casa.
Os alunos dispensaram os beijinhos de despedida,devido aos fortes espirros da professora,formaram a fila para saírem e foram embora para seus lares,doces lares,dando adeusinhos...
A professora,quase de olhos fechados devido à forte manifestação alérgica,enfiou de qualquer maneira seu material numa bolsa enorme e foi caminhando em zigue-zague até ao ponto de ônibus.
Por um milagre percebeu que um carro parara do seu lado e a custo,reconheceu um colega que lhe oferecia carona.Entrou no carro rapidamente,agradecendo aos céus por essa gentileza.Acho que,pela situação em que se encontrava,entraria em qualquer carro que parasse por perto...mesmo que fosse de um assaltante ou algo parecido.( (Quem iria assaltar uma professora?)
Desceu em frente a sua casa,agradeceu e entrou em seguida.Queria tomar uma dose forte de antialérgico,um banho demorado e dormir.Esquecera-se até da fome.Mas esse fatídico dia ficaria gravado em sua mente...para sempre!

(Carmen Lúcia)

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Foto de Thathá

Belo conto ... bem cotidiano e passa uma idéia de realidade fortíssima, eu adorei... qse desisti de lecionar agora!!! mas eu desejo lecionar para alunos mais velhos (pre vestibulandos) Deveríamos valorizar mais aqueles q tanto fazem pela comunidade.. eu acho uma injustiça q o professor tenha um salário tão miserável, um status de vida assim tão baixo (em alguns casos até pior do q o descrito) mas a vida é assim e eu tenho a esperança de q não tarde muito a chegar o dia em q veremos nossos professores valorizados e a educação no país como referência de qualidade!
Parabéns pelo conto ele é ótimo manifesto e apelo social...
bjisss

frozen kisses

frozen kisses

Foto de Carmen Lúcia

Você falou e disse...tudo o que precisava ser dito e o que eu gostaria de ouvir.Não,nunca desista dessa missão maravilhosa!Sem esperar recompensa,semeie e cultive as suas sementes...como todo bom semeador.Eu leciono para crianças de 6 a 10 anos,que são a minha praia.Já lecionei para adolescentes,mas desisti.Aprendo muito com os pequeninos.E,como vc disse:"Um dia seremos valorizados!"Quando pessoas honestas priorizarem a Educação,que é,obviamente,a base de um país,de uma Nação.
Beijos de agradecimentos a vc,querida!

Carmen Lúcia

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