Blog de Arnault L. D.

Foto de Arnault L. D.

Pelas estrelas do céu

Eu esperei encontrar no silêncio
um tanto ainda do que foi sentido
como se buscando a meu ouvido
um eco do passado... do início

Nos vestígios esparsos em mim
que ainda guardarem da história
além do pensar e da memória,
é o sentir, o que procuro enfim.

No fundo da mente, soterrado,
cavo com as unhas, garimpo gemas:
Pedaços de sonhos, coisas amenas,
que ainda fazem o olhar marejado.

E neste silêncio me vasculho,
à cata de todos os cacos de amor.
E neles, corto a carne, e nesta dor
de romper-me o peito mergulho.

Lá, tão profundo e sem senso:
Os sentidos todos, mesmo sem nexos
feito purpurina a criar reflexos,
é todo um céu estrelado, imenso...

Foto de Arnault L. D.

Incógnita jornada

Os rios sabem onde ir,
seguem para o mar.
Mesmo quando nuvens
se apressam a cair
e depois do chorar,
voltam, como reféns.

Da mesma jornada,
que ruma ao somar
doutras águas, ao mar.
E seguem a estrada
que as faz retornar
sempre ao mesmo lugar.

Os vapores da noite,
a neblina que brilha
sobre a relva ao raiar,
já seguem ao convite
de buscar sua trilha
ao um encontro maior

Talvez seja como rio
a sorte, sina ignorada
seguindo, ruma ao oceano.
A vida em modo arbitrário
cala incógnita jornada.
Água... o mar é seu plano.

Foto de Arnault L. D.

Enamorado

É doce ao paladar,
das palavras o gosto;
é música ao ouvir
o som que professar.
É brisa para o rosto
o que do amado vir.

É luz a se espalhar,
na noite, a lua cheia;
é beira-mar aos pés,
na maciez, molhar.
É arte à alma. ceia,
clara a vejo, se me és.

É tal desta maneira
que o amor, a revelia,
a coisa que convém
forja tal verdadeira
no que só há em poesia,
como esta que me vem.

Foto de Arnault L. D.

Livro

Quando um livro chega ao fim
ele abre-se na mente
a pagina final não fecha em nós
ele permanece aberto
feito semente, vindo a brotar
quiçá uma florada e depois
ao tempo a fruta do saber
no amadurar, doce, da saudade...

Quando a pagina final
debruçar sobre a penúltima
certeza um sentido vou querer
embora nem sempre o encontre
e diversas vezes as palavras
se calam por calarem-se em mim
e outras calaram-se de mim,
declamaram somente aos olhos

Mas em essência as levarei
mescladas feito em simbiose
tantas linhas que somei as minhas
enraizadas... vida enxertada
a soma germinar um novo grão
livro, arvore, será sempre aberto
em cada vez que eu buscar
palavras que li, de seus versos

Quando encerrar o livro
serei dele mais uma pagina
das historias de muitos momentos
que irei rever nos pensamentos
reler por minhas memórias, as suas
tomo inteiro que ficará aberto
impresso, de mim a se encadernar
Os “poemas de amor” que irei guardar.

Foto de Arnault L. D.

Farol

Aqui ergui um farol,
onde certa nau passou.
Na esperança que talvez
se afastados Lua e Sol,
eu possa de onde estou
guia-la a mim, outra vez.

Acendi no alto esta luz
e mantive a chama viva
e esperei sem calendários,
abrir a noite me propus.
P’ra não perder-se à deriva
destes nevoeiros, vários...

No calar de cada tarde
e na tempestade escura,
a esperar por quem navega
ateio o luzir que me arde,
para avistar, quem procura
este facho o braço entrega.

Neste mar eu fiz morada
e nortes para se encontrar,
no céu, luz a girar, girar...
Rota da incerta jornada.
E pouco a pouco a queimar
farei luz, um farol no mar.

Foto de Arnault L. D.

O Banquete ( ao mestre Augusto dos Anjos 1988 )

Transcende a dor a fria lápide
em que se escondeu, óh amada minha
em que se acabou tão doce boca
beijando aos vermes
de voraz fome mesquinha

Transcende a dor o beijo deixado
nos lábios já mornos de fermentação,
e o sangue parado, estagnado,
dá um tom arroxeado
em tua decomposição

Vai-se de presto suave aroma
trocado por fétida podridão
que molha a mortalha,
implode o ventre,
corroi e lambuza as bordas do caixão

Visceram-se as banhas;
expostas as tripas em sutura.
Como bananas maduras
“eles” devoram as entranhas.
E suas pupilas castanhas
são chupadas em vil banquete
Já me és total estranha.
E os vermes com tal cobiça
descarnam-te qual piranhas
sorvendo toda a carniça,
és deles farto banquete.
Não vejo-te amada minha,
já me és total estranha.

Foto de Arnault L. D.

Grão de areia

Como posso o tempo perder
se este não me pertence?
Apenas por ele me movimento,
sem a ele poder conter,
sem importar com que pense.
O ar me sopra qual vento.

Feito o verde mar, gigante,
e eu sendo apenas um peixe
que cruza as águas desatento.
O tempo engloba-me adiante...
Como posso o mar perder? Deixe...
Indifere correr, ou passar lento.

Se diz que eu perco meu tempo,
realmente não me importa.
Apenas colho o que dele transpasso,
não tenho como fazer um cerco
se é ele que me comporta...
Ele é mar, é ar... ele fica, eu passo.

Foto de Arnault L. D.

A alegria do desejo

O homem não busca a felicidade.
Ele se engana quando assim pensa,
a busca do homem, é pela vontade,
ou não seria tanta dor pela cidade,
na rua, no mundo, na tola crença
que se presta a velar a verdade.

A vontade muitas vezes faz ferir,
as vezes consumir a carne própria,
e alegra-se na dor que vão renega
se é o alvo que se impôs perseguir.
A felicidade, mentindo diz queria,
mas, na ruína do eu que se apega.

Foto de Arnault L. D.

Escravo

Sou apenas o escravo de meus erros
a forçar-me o aprendizado do perder,
a fazer-me conviver com muito menos
do que esperava, posto em desterros;
de quem, ou onde, eu almejei viver.
E jamais seremos realmente plenos.

É melhor sequer pensar no que seria,
melhor esquecer e deixar a vida ir.
Entregar-se a peleja por sorte, talvez;
para então poder voar em alforria.
mesmo provisoriamente, até cair,
até chegar noutro erro, outra vez.

Trago em mim cicatrizes de correntes,
velhas feridas, de todos dos grilhões
que os erros impuseram a minha pele.
Selando a ferros os sonhos impotentes,
caídos, tomados, chamados de ilusões...
que não eram; até vir quem os cancele.

Sou apenas o escravo de meus erros,
que arrebatam as rédeas de minha mão.
Por cabresto vem e mudam os meus planos,
belos caminhos que a pulso encerro,
nas picadas que abriu rasgando o chão.
Vou assim, seguindo na soma dos anos...

Foto de Arnault L. D.

Viagens imperfeitas

Guarde para mim
um pouco da festa,
que eu vou um tempo,
por estes confins...
A buscar a destra,
no caminhar lento
das rimas imperfeitas.

Guarda-me um riso
e um pouco dos dias,
pode ser só um traço,
é só o que eu preciso
para não sentir perdido,
no desterro, que abraço
nas ruas imperfeitas.

Guarde um motivo
que me traga de volta.
Como improviso ou acaso,
livre, que esteja vivo...
Me segura e não solta
na borda do raso,
deste mar imperfeito.

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